domingo, 28 de agosto de 2011

ENTRE O CHÃO E A REDENÇÃO

O seguinte texto é um fragmento de um antigo trabalho. Graças a Deus nem eu e nem você, caro leitor, subimos no parapeito...


ENTRE O CHÃO E A REDENÇÃO




Naquela noite decidi por um fim em minha vida. A sacada do meu apartamento no 13° andar parecia ser o melhor caminho a seguir. Não sei porque cargas d água quis sentir-me limpo. Tomei um banho demorado, aproximadamente quarenta minutos. Estava mais calmo que o usual, estava pensando no tempo que duraria a queda. Pensei muito, em muitas coisas...

Quem eu era? Agradei a tantas pessoas, mas nunca aquelas que de fato quis ter perto de mim. Meus caminhos de volta para casa sempre eram tristes, carregados de um sentimento de solidão, e era mesmo solidão. Lembrei até de uns versos que li em algum lugar, algo do tipo:

Nas amarguras de meu coração
Sou só porque assim sou
Se não sou, ainda vou
Mistério é ser só na multidão

Ao sair do banheiro senti que estava pronto para pular, mas, por alguma razão que ainda não entendi bem, sentei-me no sofá da sala posicionado em frente a porta aberta da sacada. Por algum tempo olhei as estrelas que homenageavam aquela noite. Por algum tempo voltei a pensar. Em que ponto da minha vida me perdi para chegar naquele momento? Sabia que havia me perdido do mundo, das pessoas, das relações sociais baseadas no individualismo de ordem estética, sem moral alguma. Seria eu um peixe fora d'água ou uma pedra com pulmões, sempre afogada na própria vida?
Fui o homem dos sorrisos, das mulheres, das piadas... das mãos calejadas e da tristeza. Caminhei sobre areia movediça, mas afundei em meus próprios pensamentos. A brisa fria que entrava pela sacada parecia ser o chamado para minha viagem. Levantei e caminhei rumo àquela porta com uma serenidade assustadora. Subi no parapeito e fiquei sentado, olhei por entre meus pés a distância até o chão. Tive a certeza de que não conseguiria pensar durante o trajeto. Com alguma concentração consegui me equilibrar e ficar de pé, queria ver uma parte da cidade...
A hora havia chegado...
Sonhei com uma vida simples, mas com um sorriso amigo em frente. Não desejei a mais bela mulher, apenas uma que caminhasse ao meu lado. Acho que desejei muito.
Eu que nunca perdi nada! Óbvio, nada eu tive...
Não temi nem perder a vida, mas porque não a tinha descoberto. Desci do parapeito não por medo de morrer, ainda penso que seria menos doloroso pular - um ato de covardia assumido -, desci com medo de desperdiçar a chance de encontrar em mim mesmo a gratidão por ter vencido a dor de viver.
Desci com a esperança de encontrar no amor as asas que a solidão me cortou...

domingo, 17 de julho de 2011

Antes que a vida acabe


Dois velhinhos contemplavam o crepúsculo em silêncio, um ao lado do outro. Arthur era um octogenário, carregava nos olhos um misto de sabedoria e ingenuidade, sua geração estava muito distante da que ele então vivia. Por outro lado, seu companheiro Miguel, uma década mais novo, traduzia em seu olhar a malandragem de uma vida despreocupada, mas que o tempo fez solitária.

Enquanto o Sol procurava seu descanso, Arthur escrevia algumas linhas num pedaço de papel. Olhava para o pôr-do-sol, refletia, balbuciava algo e escrevia. Miguel que o observava, e neste ponto o horizonte não era mais o foco de sua atenção, acomodou-se melhor naquela cadeira de praia que já começava a cansar os braços sendo carregada até o parque onde costumava jogar suas partidas de xadrez com Arthur. Todas muito breves, Arthur era uma espécie de Kasparov do lugar.

- O que você tanto escreve, meu caro amigo? – indagou Miguel não se aguentando mais de curiosidade.

- Sinceramente não sei, seu enrugado intrometido. Não faça essa cara, estou brincando. Como pode ver pelas minhas bochechas, não sou mais um mocinho esbanjando saúde, embora ainda pense que posso correr mais do que você de bicicleta. Não ria, é verdade. O fato é que o fim de minha vida tem se tornado um pensamento constante. Não com pesar, mas com aspirações. Não sei a razão. Escrevi besteiras, apenas.

- Dê-me aqui, quero ler! E apenas para constar, se você sair de moto, eu chego primeiro de bicicleta.

- Você não ia querer ler, não tem nada de relevante e...

- Passa isso logo velho! – interrompeu Miguel tomando o papel das mãos do amigo demonstrando como que, na velhice, alguns anos são traduzidos na diferença de reflexos.

- Já que você foi educado, não tenho objeções. – redargüiu Arthur sorrindo.

Miguel desdobrou o papel e começou a transitar por alguns versos que, de certa maneira, soavam como juvenis, uma inocente transcrição de consciência. As linhas eram essas:

Lista de Desejos

Queria brincar de dizer mentiras
Porque a verdade me assombra.
Queria falar de coisas bonitas
Sem que o mal fizesse sombra.
Queria dizer que vale a pena
Mas não sei se é verdade.
Queria que a vida fosse uma cena
Com atores sem vaidade.
Queria poder realmente sorrir
Sem brincar de mentirinhas.
Queria fazer minha barriga doer
Mas que fosse de tão feliz.
Queria que nada viesse roer
Algum bem que um dia fiz.
Queria não ter que falar disso
Mas é só disso que pouco sei.
Queria não querer tanto
Na vida pouco brinquei.
Queria voltar a ser criança
E exibir um sorriso largo.
Queria ainda ter esperança
De testemunhar grandes abraços.
Queria não querer tanto
Querer fazer tudo que faço.

Queria ser uma canção no rádio
Numa estação que toca amor.
Queria ser música de primavera
E respirar por uma flor.
Queria ser uma grande janela
E de um pranto sentir calor.

Queria não querer tanto
Estes meus olhos insurretos.

Queria muito não querê-los
Para não querer tudo que quero.

Arthur, percebendo a reação do amigo ao terminar a leitura, encostou com os dedos em sua perna para trazer sua atenção novamente para a conversa. A cabeça baixa que então deixava aparecer apenas uma testa franzida revelou, ao se levantar, um olhar de inquietação, um Miguel um pouco menos malandro do que o de minutos antes, se assim é certo dizer.

- O que foi Miguel, não te agradou? Eu disse que não era nada relevante e...

- Com sinceridade? – mais uma vez Miguel interrompia Arthur.

- Apenas com ela meu caro amigo.

- Queria não querer ter lido isto.

- Por qual razão? – perguntou Arthur com um olhar perdido.

- Porque agora queria ser meio século mais novo e fazer tudo um pouco diferente. Parece-me que passei a vida inteira querendo tudo que podia querer, mas nunca desejei o que deveria desejar. O que você acha?

- Acho que deveria querer algo melhor daqui pra frente, ainda há tempo. Acho que deveríamos jogar xadrez, talvez eu queira deixar você ganhar...

quinta-feira, 9 de junho de 2011

De vez em quando é preciso inovar. Criar algo novo no emprego, nas amizades, nas relações amorosas, mas, principalmente, inovar consigo mesmo.
Fala-se de poesia, mas o mundo hoje é apenas concreto, e não apenas o concreto dos prédios e das casas/fortalezas, muito distante de se tornarem lares. O mundo é concreto no sentir... falta a abstração, falta a leveza de versos livres, sem a preocupação da métrica.
Sem a métrica social, pela qual todos devem usar os mesmos trejeitos, as mesmas roupas ou gírias. A métrica econômica, sobre a qual Tolstoi muito bem pondera, onde aquele que é considerado mais feliz possuí o maior número de coisas.

Tem dias que é bom ser antiquado... é bom olhar as coisas sob uma perspectiva pouco explorada, é bom não se preocupar com a forma culta ou com a reforma ortográfica(rs), é bom as vezes pensar em largar tudo e viver de maneira mais simplória... Meros ideais românticos, mas que fazem bem por alguns instantes.

Não adianta brigar quando alguém não quer e, no final das contas, não adianta continuar querendo também. No jogo das vontades, o ideal é querer algo que outra pessoa também queira... parece estranho, mas é simples assim.

Quanto às mulheres... Ah!... as mulheres... essas são um caso à parte. Rousseau chegou a dizer que elas louvam de boa vontade aqueles que as admiram. Não sou digno de contradizer Rousseau, mas ouso afirmar que não é bem assim. Não alongarei sobre isso... exceto em conversas pessoais... assim poderei argumentar sem rodeios.

"Quando uma mulher estiver falando com você, escute o que ela diz com seus olhos." - um dia disse Victor Hugo.

Assino e carimbo.